SACERDOTE E INICIADO: CONFUSÃO DE CONCEITOS

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O conceito da palavra sacerdote é deturpado no momento em que um iniciado em Ifá ou em Orishá, acredita que basta ser consagrado e cumprir os dogmas do culto, que poderá no futuro ser um maestro de sua religião, no melhor dos casos construindo uma visão errônea de que o tempo, o estudo, ou mesmo a maturidade são o suficiente para a formação religiosa de um sacerdote, seja em Ifá, no Candomblé, ou na umbanda quando na verdade não é.

A vocação (aptidão natural) é um dom imprescindível para que nosso Ori compreenda de forma clara os desígnios do culto que professamos, sendo esta a base espiritual fundamental para o desenvolvimento sacerdotal de um indivíduo na religião (Osá Di, Obara Oyekun) e são poucos os que nascem com ela.

É de vital importância ter a consciência de que cada pessoa nasce com um destino, uma razão por estar nesse mundo e desta forma compreender que nascem pessoas predestinadas para serem médicos, professores, advogados, engenheiros e outras para serem sacerdotes etc (Ogbe Di), ou seja, viver de acordo com destino que a nós foi predestinado.
Em Iroso Oturara, Obatalá fez com que Ogun compreendesse que por mais que ele fosse consagrado em Ifá, ele seria mais útil à humanidade sendo construtor das ferramentas que trariam a evolução do mundo e ele faria história e seria imortal e imprescindível a todos, do que sendo Babalawó, livrando Ogun da frustração e do fracasso.

Esse Odú explica que por mais que uma pessoa tenha Orishá, ou Ifá consagrado (Babalawó) com muitos anos de iniciados e tenha recebido todos os poderes do universo, nenhum desses poderes ou consagrações (Kuanado, Olófin, 30 anos de consagrado, em Orishá ou Ifá) é o suficiente para transmitir um dom e um poder que não tenha nascido com a pessoa, ou seja, nada é capaz de transformar uma pessoa em Babalorixá, ou Babalawó se este não tenha nascido para tal, pois quem é sacerdote nasce com vocação de sacerdote, quem é Babalorixá nasce Babalorixá, os cerimoniais e os estudos são os degraus fundamentais para que este sacerdote tenha essa consciência da espiritualidade ao longo de sua formação.

Quantos religiosos estão frustrados em seu sacerdócio sem ter a consciência de que não nasceram para o mesmo, deixando de brilhar em seu real destino?
Quantos Babalorixás e Babalawós estão fracassados em sua jornada por não entenderem que não nasceram para tal deixando de serem felizes e realizados em seu real destino?
Lembre-se se uma pessoa busca uma posição sacerdotal sem ter aptidão natural para realizar o sacerdócio, serão sacerdotes medíocres e fracassados destruindo a si e aos demais. (Iroso Otura)
Babalawó e Babalorixá não se faz, nascem com o ashé e se desenvolvem com o aprendizado e maturidade ao longo de sua jornada espiritual (Baba Ejiogbe).

Em Ifá um homem que se inicia como Awó Ni Orunmilá (duas mãos de Ifá) não se torna um Babalawó somente com a consagração, visto que para isso é necessário aptidão, tempo de estudo e principalmente maturidade e um aprendizado intenso ao lado de seus maiores que avaliarão seu preparo.
Ao longo dos anos tenho escutado sair da boca de meia dúzia de aventureiros formadores de opiniões, mas que extraíram dos livros de estantes, ou mesmo de reuniões fúteis pautadas mais na vaidade e no ego, conceitos totalmente distorcidos e imaturos com relação à formação em Ifá, seres bitolados em seu raciocínio que não compreenderam a filosofia da religião onde foram iniciados, acredito eu, graças à falta de entendimento de seus maiores (iniciadores), já que ninguém pode dar aquilo que não teve.

O conceito real de Ifá determina que em situações seguintes uma pessoa possa ingressar no universo de Ifá (Babalawó), estas são:
Primeiro: Determinação de Ifá, pois sacerdote não forma opinião, segue as determinações de Ifá, estuda para interpretar as palavras de Ifá e tudo que for fazer deve se perguntar e ter autorização de Orunmilá (Okana roso).
Segundo: Pessoa que tenha um Odú em Awó Fakan, perigos de morte prematura ou problemas crônicos onde a necessidade espiritual deve ser maior (Ejiogbe).
Terceiro: Em casos extremos onde os recursos terminam e Orunmilá indique por saúde e longevidade (Okana Bara).
Quarto: Por caminho necessidade espiritual (Ogunda Bede).
Quinto: Por indicação de seu Odú pessoal (Otrupon odi).
Sexto: herança religiosa (Ojuani Birete).

Lembrando que não estamos formando sacerdotes quando iniciamos uma pessoa como Awó Ni Orunmilá. A iniciação como Awó não é um cargo de Babalawó, não é uma cerimônia de graduação, mas sim a permissão para que o neófito possa a partir de então se aprofundar nos segredos do culto, convertendo-se em um seguidor de Orunmilá, nada mais. Sempre deixo claro aos meus afilhados, para que suas vaidades não sejam maiores que sua consciência religiosa e estes não se percam antes de se acharem, pois o que começa mal termina mal (Osá Kana).

Costumo dizer que a cada dez Awós, um nascerá com esse destino. Um líder em qualquer religião deve ter a consciência da filosofia da religião que professa a fim de conscientizar os recém-iniciados do conceito real de sua religião para não formar Babalawós frustrados e medíocres, que no final viverão para criar mentiras, inventando opiniões e conceitos infundados que favoreça sua falta de capacidade e religiosidade, pois sabem que se não for na mentira, na calúnia ninguém acreditará em suas supostas religiosidades, mas como a mentira e a calúnia não estão bem vistas por Olófin, são desmascarados, caindo no descrédito, sendo humilhados diante da sociedade e consequentemente envergonhando seu culto religioso. Esses homens prematuros, sejam no Candomblé ou em Ifá, passam por cima dos verdadeiros princípios religiosos, destruindo consecutivamente a religião e a vida de todos e para se exaltarem, necessitam levantar calúnias de outros sacerdotes para justificar sua falta de aptidão, e no fim uma baderna religiosa (Odi Ogunda).
Errado não é você consagrar um Awó Orunmilá, errado é dizer que este será um Babalawó sem avaliar sua essência e muitas vezes criando um delinquente capaz de destruir a vida de muitas pessoas, como tenho tido notícias. Errado é um sacerdote ensinar os caminhos trocados (Oyekun).

Aprendi Ifá na presença de meus maiores, fui avaliado diante de sacerdotes que realmente conheciam Ifá, recebi o aval de meu Ojugbona Kan Erdibre de atuar como sacerdote e diante de várias circunstâncias, dei prova de meu preparo religioso (Ogunda meji) e na presença de quem queira me coloco a disposição para qualquer debate, conversa, em qualquer lugar, dialogo com quem seja com objetivo de engrandecer a religião. Aprendi em meu Odú Ifá que só se propõe a algo quando estamos convictos de nosso preparo (Otura Aira). Não acredito em sacerdotes que ainda não conseguiram absorver de sua religião recursos necessários para salvação de sua própria vida, não acredito que esses personagens tenham forças espirituais de salvar alguém antes de terem salvado a si próprio (Ojuani Iroso).
Será que um Awó recém-iniciado já resolveu seus conflitos espirituais e materiais ao ponto de se julgar capaz de ajudar alguém? Pois é, hipocrisia!
Então julguem primeiro a si, pois disse Ifá, que antes de olhar a casa do outro, que olhem a sua.

Além da vocação religiosa a formação de um sacerdote consiste em:
Primeiro: Conhecer todos os procedimentos litúrgicos do Culto (Iroso Kana)
Segundo: conhecer a base dos 256 odús de Ifá e nunca consultar ninguém se não conheça os extratos dos 256 odús (Iwori Logbe)
Terceiro: Tempo natural para adquirir maturidade e conhecimento religioso conhecendo o universo religioso onde se desenvolve (Obara Kana).
Quarto: Esta no destino (Ogbe Di).
E como ficam os que não têm caminho de ser líder no culto e são iniciados como Babalawós? É simples, em uma sociedade espiritual existem várias especializações, mesmo que um não tenha dom para o sacerdócio, ou para a liderança, este vai encontrar dentro de seu culto funções onde este se identificará e se desenvolverá como existem Babalawós que se especializaram em montar poderes, outros bons intérpretes, outros que são mestres em dirigir um ritual cerimonial (Oba), outros que conhecem os cantos litúrgicos, os responsáveis pelas escrituras, os que nasceram para serem líderes de um povo responsáveis por formar outros Awós, outros para levar a palavra de Ifá no mundo etc. Em Ogbe Di expressa que devem existir Babalawós de especialidades distintas, pois o saber, dom natural, está repartido e ninguém tem o dom para fazer de tudo e por este motivo todos somos importantes dentro de uma sociedade (Osa Wo).

Errado é recém-iniciado consultando Opelé.
Errado são religiosos imaturos iniciando pessoas.
Errado é receber poderes antes do tempo.
Errado são Awós debilitados em seu conhecimento pregando Ifá.
Errado é não compreender a essência filosófica de sua Religião.
Texto Evandro Luis de Carvalho, Omo Oni Shango, sacerdote do Culto de Ifa, Odú Otura Aira Ifá Ni L’Órun.